Um prédio de cara lavada – Sobre a fachada do B32

Sou um agnóstico com fé, uma contradição, uma definição de pernas para o ar. Mas antes de você rir, eu explico: Não falo da fé no divino, mas de uma fé terrena, nos homens. Acredito naqueles que lutam por alcançar algo, em especial aqueles que buscam fazer “o que é certo”, se pautam por valores, buscam tanto a verdade quanto a virtude.

 

O caminho da virtude, o “high ground” com dizem em inglês, é uma trilha íngreme cheia de dificuldades que requer coragem e esforço, cujo destino é quase sempre  inatingível, difícil de chegar e também de permanecer. O caminho do vício, pelo contrário, é da preguiça, da covardia, fácil, de descida, cujo destino é um lugar fácil de chegar mas sempre difícil de sair.

 

Depois de toda essa filosofia barata, você já deve estar se perguntando se este é aquele artigo sobre o edifício B32? – é aqui mesmo! Existe lógica por detrás desta loucura.

 

O Design do B 32 é do arquiteto americano Chien Chung Pei, e sua beleza vem da simplicidade e da força de sua forma geométrica. Um design clean, com uma linguagem concisa, de poucos elementos – a esquadria, o vidro, a forma de prisma, lembrando um diamante, e a implantação transversal. Essa opção de design se assenta quase que exclusivamente nas qualidades do detalhamento e execução da fachada. É interessante como isso nos remete a outra instância relacionada: a Pirâmide do Louvre, desenhada pelo pai do nosso arquiteto, o célebre I. M. Pei. De forma similar, naquela intervenção arquitetônica, a simplicidade da geometria aliada ao alto padrão da execução produziu um forte e contrastante no Barroco deslumbrante do Louvre.

 

O B32 tem algo dessa simplicidade impactante. A fachada do nosso prédio tem como atributos primordiais a forma e a transparência, e esta é a virtude essencial que queremos atingir. Queríamos fugir das fachadas espelhadas, opacas, mascaradas, sem rosto, sem cara.  A transparência que queremos protege, mas não bloqueia, ilumina sem prejudicar o cálculo energético, cobre, mas não tapa, não esconde, uma fachada que tem como característica essencial não ser fechada, mas ser fachada transparente. E transparência talvez seja a qualidade, digo a virtude, definidora deste empreendimento.

 

Queremos um prédio do qual os ocupantes se orgulhem de chamar de seu, aberto, comprometido com a cidade, que permita às pessoas desfrutar da mágica que um espaço público. Um espaço conectado com a rua – que atrai a vida e, ao mesmo tempo, a irradia de volta para cidade. Um espaço sem muros,  acolhedor a todos, permeável e transparente.

 

Aproveitamos a construção deste prédio para explorar, discutir e compreender tudo que um empreendimento desta natureza envolve – sua relação com as pessoas, com a cidade, com a eficiência sustentável e até seu significado simbólico, histórico, humano. Ao mesmo tempo em que buscávamos entender, queríamos compartilhar tudo que estávamos apreendendo: se a natureza da mentira é ocultar e enganar, a virtude essencial da verdade é ser transparente e acessível a todos.

 

O projeto do B32 tinha objetivos definidos, executado por uma equipe comprometida,  com esse compromisso firme  e transparente. 

 

Uma obra sustentável, responsável, que cuida do presente, se preocupa com o futuro e respeita o passado, uma visão íntegra, com o olhar para além das barreiras, transparente.

 

Incrível como a simplicidade das formas arquitetônicas nos conduziu à sua virtude essencial – a fachada de vidro – que por sua vez nos levou a buscar a qualidade intrínseca de uma fachada – a transparência. E esse atributo acabou por identificar as qualidades, isto é, as virtudes que buscávamos na incorporação do nosso prédio e também nos conduzir para além do lado comercial do negócio, em direção aos valores éticos urbanos, que fazem dele uma parte da cidade.

 

Projetar e executar esta fachada, com vidros especiais, com esquadrias insuladas, em sistema unitizado, é uma proposição complexa e bem mais onerosa do que as alternativas mais usuais. Incorporar um prédio desses sempre será um trabalho custoso e difícil, no limite do inatingível. Requer coragem, esforço e até sacrifício, confirmando, mais uma vez, que a busca da qualidade, da urbanidade e dos sonhos nunca é fácil, como, aliás, nunca foi a busca pela virtude.

 

Como você pode ver, o high ground é um caminho que além da razão necessita de muita paixão e de uma pitada de fé.